Gerentes de Unidade Básica de Saúde

Durante esse capítulo, defendemos a gestão o mais horizontal e participativa possível, ou seja, não é privativa de nenhuma categoria profissional e deve envolver inclusive os usuários que atendemos. Também nos preocupamos em apresentar a complexidade crescente dos serviços de saúde na Atenção Primária, e mostrar que não há modelos de gestão prontos que se adequem às heterogeneidades de cada Serviço, território e equipe de trabalho. Em suma, a gestão estará em constante construção.

Nesse cenário, espera-se do gerente competência para liderar o processo de gestão. Enquanto líder, deve saber trabalhar com sua equipe de maneira a desenvolver os conhecimentos e habilidades do grupo, buscando sinergia e aprimoramento contínuo. Também é desejável que o gerente seja um bom negociador, uma vez que parte do seu trabalho é intermediar os interesses e possíveis conflitos entre a comunidade, usuários, trabalhadores, gestão pública, organizações sociais e afins.

Penna et al. (2004) apontam para o gerente a necessidade de se ter envolvimento não só com o trabalho técnico-administrativo na unidade, mas, também, com os aspectos políticos que envolvem contato e interação com a comunidade, o que faz com que se busque uma efetiva participação popular em sua conduta. Os autores relatam, ainda, a importância de uma articulação intersetorial para atender às demandas visando à resolutividade dos problemas apresentados e à importância do trabalho em equipe.

Quase sempre cabe ao gerente promover os espaços para o processo de planejamento e tomada de decisão do serviço. Isso significa que, paralelo às atividades assistenciais, grupos educativos e visitas domiciliares, há de se criar possibilidades coletivas sempre que possível, para estudo dos indicadores epidemiológicos, necessidades da população, planejamento das ações e avaliação. Grande esforço faz-se necessário para não permitir que a demanda do dia conduza o processo de trabalho. "Apagar incêndio" não pode ser a lógica do trabalho cotidiano.

André e Ciampone (2007, p.836) destacam outras dificuldades inerentes ao papel dos gestores de UBS no município de São Paulo:

 

(...) é importante ressaltar que no nível local eles são reféns de regulamentações que restringem severamente, no plano formal, sua autonomia. Dentre outras limitações, não contam com orçamento próprio para gerir recursos humanos, contratar, descontratar, realizar negociações salariais ou instalar mecanismos de incentivo ou sanção condicionados à produção de metas quanti ou qualitativas. Os servidores concursados não podem ser demitidos e, para que ocorra uma simples transferência, o gestor depende da anuência de instâncias de âmbito regional e central. (ANDRÉ; CIAMPONE, 2007, p.836)

A falta de formação em gestão é um agravante às responsabilidades e expectativas que se tem para com o gerente, e pode comprometer completamente seu trabalho. A formação dos profissionais da área da saúde é eminentemente técnico-assistencial. O ensino de gestão e ferramentas administrativas é muito desigual entre as profissões, e podem ser muito focalizadas para a área hospitalar. A trajetória profissional é muito parecida para a maioria dos gerentes. Depois de acumular experiência na assistência o funcionário é selecionado ou convidado a assumir o cargo de gerente. Vê-se então obrigado a aprender no dia a dia, entre erros e acertos, as melhores formas de conduzir o seu trabalho. Profissionais em muitos municípios do país vivem situações piores, tendo que acumular a função assistencial com a gerência. Apesar da gerência já ser um cargo em muitas UBS, ainda precisa ser mais profissionalizada.

Para concluir, destacamos que o SUS tem conseguido superar obstáculos importantes em seu processo de implantação. Progressivamente, temos ampliando o número de serviços e profissionais na Atenção Básica em praticamente todos os municípios do país, mas ainda há muito espaço para ampliação da Estratégia Saúde da Família e melhorias na infraestrutura e redes de atenção à saúde. A descentralização do SUS é uma realidade, cabe agora valorizar o trabalho participativo e os mecanismos de controle social.