A família como instituição tem sido extensamente debatida por muitas áreas do conhecimento. Suas funções passam por mudanças significativas ao longo da história. O próprio conceito de família modifica-se histórica e culturalmente. Contudo, sua importância e seu papel essencial permanecem.
Há alguns anos, debatia-se a morte ou a falência da família. Mas, qual modelo de família estava em debate? A família tradicional – composta de um casal heterossexual, com seus descendentes e ascendentes, integralmente responsável pela formação e socialização das crianças – é um modelo que não faliu, mas convive atualmente com vários outros tipos de composição familiar.
Hoje, a formação dos filhos envolve, muito mais diretamente do que antes, a escola, os meios de comunicação e a sociedade globalizada. O divórcio, as mudanças no papel da mulher e as novas tecnologias vêm impondo modificações em toda a sociedade. As separações e os casais recompostos são mais frequentes, e muitas famílias são constituídas de pai, mãe, os filhos de uniões anteriores e mais os filhos em comum. Também são frequentes famílias monoparentais, especialmente aquelas formadas pela mãe e seus filhos. Outros arranjos, como o constituído por casais homossexuais e seus filhos concebidos com as novas técnicas, ou adotados, vêm ganhando espaço e reconhecimento no ambiente social e jurídico. O fato de grande parte das mulheres ter ingressado no mercado de trabalho gerou importantes transformações na dinâmica familiar. Muitas das funções antes cumpridas exclusivamente pela mãe passaram a ser divididas com creches, escolas, cuidadores profissionais e também com os pais. Até recentemente, era comum que as avós assumissem os cuidados com os netos enquanto a mãe trabalhava. Hoje, muitas avós também trabalham, ou têm atividades que os impedem de ter esse compromisso. Em alguns lares, a mãe trabalha enquanto o pai assume a casa e as crianças.
O modelo de família ocidental mais tradicional inclui pai, mãe e filhos. A noção de geração ou ancestralidade está presente em tal definição. Este é um ponto central. Por que se espera que a família envolva membros adultos e não adultos? Esse aspecto nos remete a questões relativas às funções familiares. Mas isso será abordado mais adiante. Voltemos às definições.
No Brasil, a partir dos anos 1980, muitas modificações pertinentes ao conceito de família têm ocorrido. A Constituição Brasileira, em seu artigo 226, define a família como a base da sociedade, reconhece a união estável, entende que a entidade familiar pode ser formada por qualquer um dos pais e seus descendentes e estabelece que os direitos e deveres são igualmente exercidos pelo homem e pela mulher (BRASIL, 1988).
Do mesmo modo, o Novo Código Civil (2002) reconhece os direitos de filhos havidos fora do casamento e estabelece o "poder familiar" igualmente compartilhado por pai e mãe, em substituição ao "pátrio poder" anteriormente definido (BRASIL, 2002). O Estatuto da Criança e Adolescente (ECA, 1988) reconhece direitos para crianças e estabelece deveres para adultos, Estado e sociedade, em um contexto muito diferente dos anteriores. Mudanças como essas ocorrem devido às novas situações impostas pela contemporaneidade que, ao mesmo tempo, implicam modificações culturais e jurídicas.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) define família como o "conjunto de pessoas ligadas por laços de parentesco, dependência doméstica ou normas de convivência, residente na mesma unidade domiciliar, ou pessoa que mora só em uma unidade domiciliar" (http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/condicaodevida/indicadoresminimos/conceitos.shtm). Considera, portanto, um casal como uma família, ou até a pessoa que mora só como "família unipessoal", privilegiando o domicílio comum em sua definição.
Avaliamos que as definições propostas pela Lei Maria da Penha vão ao encontro ao que se observa no trabalho cotidiano com a população assistida pela Estratégia Saúde da Família (ESF). De acordo com essa lei, o âmbito doméstico é definido como "o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas", enquanto família seria "a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa".
Segundo o manual do SIAB, ao cadastrar as famílias, os agentes comunitários de saúde, quando encontram várias pessoas dividindo um mesmo espaço, seja sobre o mesmo teto ou quintal, deve considerar a definição do IBGE anteriormente citada, incluindo os empregados que vivem no lar. Do ponto de vista prático, há instituições ou municípios que orientam o cadastro individualizado por número de fogões e/ou geladeiras. Essa pactuação, no entanto, deve ser feita em nível local e considerando a realidade do território.