Educação em saúde
Adriana Germano Marega Machado e Luciana Coutinho Simões Wanderley

Contextualizando a Educação Permanente em Saúde na prática das Equipes de Saúde da Família

Para produzir mudanças no processo de trabalho das equipes, nas práticas de gestão, de atenção e de controle social, é fundamental dialogar com as práticas e concepções vigentes no SUS de forma a problematizá-las não em abstrato, mas no concreto do trabalho de cada equipe e nos espaços de interação entre elas, a comunidade e a gestão, construindo novos pactos de organização do sistema, a partir da convivência e de estratégias e de ações que aproximem o SUS que temos dos princípios da reforma sanitária (BRASIL, 2005).

A Educação Permanente em Saúde (EPS) parte do pressuposto da aprendizagem significativa e problematizadora, propondo estratégias que possibilitam a construção coletiva, além de nortear caminhos para uma relação dialógica e horizontal, em que cada protagonista do SUS (trabalhadores, usuários e gestores) possa compartilhar, ensinar e aprender, construir e desconstruir concepções, ideias e conceitos acerca da saúde, de sua produção e operação e de seus papeis. A ESP, portanto,


Nesse sentido e tendo em vista a educação no trabalho como eixo norteador das ações de saúde dos trabalhadores do SUS, em 2004 o Governo Federal institui a Política Nacional de Educação Permanente em Saúde (BRASIL, 2004). Em 2007, o Ministério da Saúde revitaliza essa política por meio da Portaria 1.996/GM/MS, a qual avança para o direcionamento apresentado pelo Pacto pela Saúde, em 2006. Nela se expressa o foco na descentralização de suas ações; o fortalecimento das instâncias gestoras, da gestão participativa, das necessidades locais e regionais e do maior envolvimento dos governos estaduais na sua gestão e efetivação. (BRASIL, 2007a).

A política nacional de EPS constitui-se, portanto, em uma ferramenta importante para o trabalho da equipe multidisciplinar com projeções relevantes para a efetivação da interdisciplinaridade, a partir de ações integralizadas e humanizadas, ampliando a liberdade dos trabalhadores e criando espaços coletivos comprometidos com os interesses e as necessidades dos usuários. Desse modo, a EPS se torna não só uma estratégia de mudança dos perfis dos profissionais, uma vez que permite a criação de espaços de coletividade, nos quais cada indivíduo é visto em seu processo de trabalho como protagonista desse meio, tornando-se instrumento e ator social do cenário no qual está inserido (BRASIL, 2007).

Dessa forma, falar de formação profissional específica para atuação no SUS envolve desafios, limites e possibilidades que estão postos para todas as categorias que integram os diferentes níveis de Atenção à Saúde. Por desafio, enfatizamos o movimento de ruptura do paradigma das formações curativistas e biologicistas das diferentes categorias profissionais, superando a visão de que ao técnico de saúde cabe o saber absoluto sobre os processos de adoecimento da população, desconsiderando sua contribuição como sujeito na produção do cuidado (BRASIL, 2005).

Outro desafio é delegar ao "Estado", na figura dos gestores do sistema, a responsabilidade absoluta pelos processos de EPS. O Ministério da Saúde, na publicação do Guia prático das Equipes de Saúde da Família, ressalta esse compromisso com a afirmativa:

Sendo assim, cabe a todos os integrantes das Equipes de Saúde da Família, nos seus campos de saberes e a partir das necessidades do serviço, efetivar o compromisso de realizar e participar das ações de EPS de forma colaborativa e contextualizadora, não se limitando a ações verticalizadas e programáticas focadas na doença.

A EPS vem para romper essa prática cartesiana, ao propor produzir conhecimento a partir da democratização do saber, por isso também é considerada uma ferramenta importante para a gestão de coletivos, pois apresenta um conceito e um fazer que se diferenciam dos processos de Educação Continuada (VASCONCELOS at al., 2009).

Quando trabalhamos na lógica da educação continuada, prática comum nos processos educativos em saúde, falamos de uma lógica prescritiva, em que geralmente se transmite o que é considerado "a melhor prática", sem abordar as capacidades, os limites e as possibilidades locais, o objetivo é o acúmulo do saber (VASCONCELOS et al., 2009).

Esse processo pode ser vivenciado de duas diferentes maneiras:

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Se vamos a uma palestra, um seminário ou congresso, ou mesmo uma capacitação ou reunião técnica específica predeterminada, sem possibilidade de discussão ou contextualização, adquirimos conhecimento por transmissão, ou seja, esse saber se torna tácito (apenas voltado para nós) e pouco factível para nós. Essa metodologia de ensino se torna pouco efetiva, pois quase sempre não permite a articulação da temática com o serviço. Nesses momentos costumamos usar a expressão "o evento foi ótimo, mas não se aplica à nossa realidade, impossível fazê-lo" e, dessa forma, temos acesso ao conhecimento pelo conhecimento.

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Se incorporarmos as possibilidades que a EPS propõe como democratização do saber, ao compartilhá-lo (torná-lo explícito) e propiciar uma discussão e reflexão durante um momento programado com toda a equipe, esse conhecimento pode ser agregador e orientador para a realidade que a equipe possa estar vivenciando, além de projetar possibilidades de avaliação e autoavaliação de nossas práticas, na perspectiva de buscar alternativas de transformação do processo de trabalho para o alcance de resultados mais efetivos e eficazes; nesse momento, somos presenteados com a democratização e a socialização do conhecimento que de individual passa a coletivo.

Especialização em Saúde da Família
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