Habilidades de comunicação: abordagem centrada na pessoa

Mariane Ceron

Introdução

Raras são as pessoas que não tenham qualquer história de insatisfação em relação aos profissionais de saúde. Na maioria das vezes, as queixas sobre o atendimento dizem respeito a falhas de comunicação com o profissional: a inabilidade em acolher e escutar o suficiente para tirar conclusões; a utilização de jargão excessivamente técnico e pouco compreensível ao ouvinte; ou mesmo certa frieza demonstrada pelo profissional diante da situação global de vida do paciente.

No contexto da Estratégia Saúde da Família, a comunicação possui importância ainda maior. É fundamental conquistar e manter vínculo com as diversas famílias do território de saúde, visando à realização do cuidado em acordo com os princípios da universalidade, da longitudinalidade e da integralidade do SUS. Somos a porta de entrada do sistema e nos encontramos expostos às mais diversas demandas, queixas e pedidos da comunidade.

Para problematizar ainda mais nosso papel, devemos lembrar que as famílias, na maioria das vezes, foram historicamente educadas segundo: o paradigma assistencialista centrado na dor/doença; a crença na cura mágica pelo acesso aos equipamentos de última geração do hospital; e a fé na histórica figura do médico, que teria o poder quase divino de salvar vidas. Nesse universo, portanto, não é nada fácil a tarefa de coordenar as ações de cuidado às famílias de acordo com as possibilidades apresentadas pela equipe e pela rede de serviços.

No nível da Atenção Primária, não possuímos acesso a esse campo das "curas imediatas", desejado pela população. Nossa clínica é diferente, pois trabalhamos de acordo com outro modelo assistencial – visando à promoção e à prevenção de saúde, apostamos nas mudanças de hábitos de vida e na transformação sociohistórica e participativa dos determinantes de saúde. Construímos nossas práticas a partir do princípio da integralidade do atendimento, unificando nossos olhares sobre as mais complexas dimensões do contexto bio-psico-social familiar e comunitário, por meio da soma de esforços da equipe interdisciplinar.

Ao lidar com o complexo contexto social, ambiental, histórico e humano do território de saúde, ampliamos nossa visão, e a equipe passa a ser uma instância estratégica de atuação, mais do que apenas um profissional específico – por exemplo, o médico. Nesse contexto, as tecnologias leves de cuidado passam a ter elevada importância, pois passam a fazer parte dos nossos objetivos:

  • a capacidade de diagnóstico precoce visando à prevenção de agravos;
  • a capacidade de reconhecer situações socioambientais que comprometam a saúde;
  • a capacidade de estabelecimento de vínculo visando à transformação;
  • a capacidade de sensibilização;
  • a capacidade de motivar para adesão aos cuidados à saúde;
  • a capacidade de educar a comunidade fortalecendo o seu empoderamento, para a construção ativa e participativa do SUS.

    As tecnologias leves se encontram em contraste com as tecnologias pesadas, tais como os equipamentos especializados, de última geração, presentes em hospitais e laboratórios especializados, especialmente no nível terciário de Atenção à Saúde. São as habilidades de comunicação verbais e não verbais, a capacidade de vínculo afetivo e as atitudes em relação aos usuários que melhoram a qualidade do atendimento e sua resolutividade.

O desafio no desenvolvimento de habilidades de comunicação se traduz na capacidade que temos de ser mais assertivos em nossas intenções terapêuticas. O primeiro passo é substituir a tradicional relação distanciada, aparentemente neutra e livre de afetos com o paciente, por níveis mais profundos de acolhimento e vínculo com as famílias. A relação se torna mais humanizada e horizontal por meio de falas, perguntas, posturas e gestos capazes de empatia e acolhimento, minimizando os lugares de poder historicamente instituídos no relacionamento entre profissionais de saúde e pacientes. Assim, os pacientes transformam-se em sujeitos.

Empregamos de 85% a 90% de nosso tempo de trabalho nos comunicando, e sabemos que a qualidade dessa comunicação aumenta a adesão ao tratamento, melhora o prognóstico, aumenta a satisfação e diminui denúncias e processos contra profissionais de saúde.

Certos questionamentos passam a fazer sentido:

  • O que é uma boa comunicação?
  • Do que precisamos para nos comunicar melhor?
  • Que aspectos da minha forma de me comunicar podem ser transformados para melhorar minha clínica?
Especialização em Saúde da Família
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